Volta a Berlim em algumas artes
Quando eu morava em São Paulo na virada do milênio, não havia uma exposição, filme ou encontro que eu quisesse perder. Íamos do MAM-SP ao CineSESC, do Instituto Tomie Ohtake à Biblioteca Mário de Andrade, se possível num mesmo dia. Era aquele ritmo estonteante, jovens que queriam ver tudo, saber tudo. A idade e os compromissos com a tela do computador começam a atrapalhar mais tarde. Sempre digo a amigos mais jovens que estão escrevendo o primeiro livro: aproveite esta liberdade maravilhosa.
O ritmo em Berlim é vertiginoso também, ainda que nos últimos tempos eu mal possa acompanhar tudo. Não há uma semana em que não haja algo “imperdível” acontecendo, de concertos de grandes nomes (esta semana foram PJ Harvey e Bruce Springteen) a apresentações de amigos que estão já fazendo suas carreiras na cena local. Mas o que me interessa mais, especialmente nesta página, é poder espalhar alguns nomes que demorariam ainda algum tempo para aparecer na imprensa principal. Antes da internet, viver no Brasil e esperar notícias rápidas do que os contemporâneos e mais jovens estão fazendo em outro país era praticamente impossível. Na literatura, dependia-se de traduções, e seja nela ou na música, nas artes visuais, etc., dependia-se de publicações estrangeiras caras e especializadas. Então seguem aqui alguns nomes que eu recomendo seguir, de gente da minha geração e dos mais jovens, explodindo agora no subterrâneo, como minas.
O poeta norte-americano Frank O’Hara (1926-1966) tem um poema famoso chamado “Why I am not a painter”, que diz, nas primeiras linhas (a tradução é minha): “Eu não sou pintor, sou poeta. / Por quê? Eu acho que preferiria ser / pintor, mas não sou.” Em outro poema ele diz às vezes acreditar que “estava apaixonado por pintura”. Não sei se preferiria ser pintor, mas tenho um prazer grande em estar ao redor deles. Esta semana, visitei o estúdio do jovem pintor alemão Malte Zenses, que vem despontando na cena alemã, com exposições individuais (a última na galeria Kadel Willborn de Düsseldorf) e que acaba de passar pela feira Art Cologne.
Nascido em Solingen em 1987, ele estudou em Offenbach com o escultor alemão Wolfgang Luy, e formou com outros artistas da academia o coletivo Neue Offenbacher Schule (Nova Escola de Offenbach), ao lado de outros artistas que considero excelentes, como David Schiesser e Tom Król. O nome do coletivo joga com vários nomes oficiais, da Frankfurter Schule (de filosofia) à Leipziger Schule e Neue Leipziger Schule em artes visuais. É interessante visitar um artista de outra arte, com seus trabalhos em andamento nas paredes do estúdio. Recomendo ficar de olho nestes nomes.
Outro encontro que tive esta semana foi com o músico e produtor alemão Nelson Bell, que se apresenta como Crooked Waves. Músicos talvez sejam os artistas que mais conheço em Berlim, por ter organizado vários concertos por aqui. De todos os mais jovens que conheço, entre os alemães, Nelson Bell está certamente entre os melhores e mais talentosos. Nascido em 1992 em Regensburg, na Baviera, ele teve uma infância incomum. Devido ao trabalho do pai, cresceu na Namíbia, passando mais tarde pela Irlanda e terminando seus estudos escolares em Seattle, nos Estados Unidos.
Em Berlim há três anos, onde está estudando produção musical eletrônica, ele está prestes a lançar seu EP de estreia, chamado Floating. Uma das faixas já estreou na Rede, intitulada “Little Mess” e com vocais da nipo-americana Lynn Rin Suemitsu, que se apresenta como RIN. Clique aqui para ouvir.
No sábado, consegui ver, no último dia, a exposição do fotógrafo alemão Heinz Peter Knes na galeria berlinense Silberkuppe. Nascido em Gemünden am Main em 1969, Heinz Peter Knes é da mesma geração de outros fotógrafos alemães que se tornaram famosos por seu trabalho em publicações de moda inglesas como Wolfgang Tillmans. Baseado em Berlim, Knes é menos conhecido internacionalmente, mas figura icônica especialmente do mundo queer após uma série sua na revista Butt.
Terminei o fim de semana em uma das melhores séries de leitura da cidade, a da revista artiCHOKE. Com uma performance da nova peça das britânicas Lisa Jeschke e Lucy Beynon, simplesmente excelente, e leituras de Jackqueline Frost e do também excelente poeta norte-americano Rob Halpern, autor de um dos grandes livros do nosso tempo, Music for Porn, entre outros. Alguns dos pontos do turbilhão berlinense. Mais, no próximo.