Brasileiros, porém universais
Esta é minha última noite no México, onde participei da Feira Internacional do Livro no Zócalo, com muitas editoras mexicanas ocupando a praça central da Cidade do México, a maior do mundo. Como a Feira do Livro de Frankfurt no ano passado e o Salão do Livro de Paris no ano que vem, a literatura brasileira foi a homenageada na feira mexicana deste ano. Passaram pelas tendas de leitura do evento, que homenageavam escritores do país como Octavio Paz e Efraín Huerta, os prosadores brasileiros Assionara Souza, Santiago Nazarian, Lima Trindade, Maria Alzira Brum e os poetas Angélica Freitas e Ferréz, entre outros. Foi lançada uma antologia com poetas da periferia de São Paulo, também saíram livros de alguns dos escritores convidados.
Passamos por um momento de grande interesse no mundo pela literatura nacional. Talvez “grande” seja exagero, mas há décadas não se via um interesse dessa intensidade. Já comentei neste espaço alguns casos específicos, como as traduções da obra de Clarice Lispector nos Estados Unidos e Alemanha, e a chegada da obra de Hilda Hilst à língua inglesa. Esta semana, soube que a Penguin Classics lançará em inglês uma nova tradução do grande clássico anti-épico nacional, Os sertões (1902), de Euclides da Cunha, com tradução de Elizabeth Lowe sob o título Backlands – The Canudos Campaign. A tradução anterior era a de Samuel Putnam, um dos primeiros a discutir e divulgar o escritor brasileiro fora de nossas fronteiras. Aos poucos, Machado de Assis vai recebendo a atenção internacional que merece, ainda que talvez dure ainda algum tempo até que se una no imaginário mundial aos seus contemporâneos, como Henry James e Anton Tchekhov. Mas acredito que é apenas questão de tempo. Muitos hoje sabem que há mais na literatura brasileira que Jorge Amado…ou Paulo Coelho. Algo que percebo também é uma mudança de atitude em relação ao próprio desconhecimento, ao menos entre europeus: há a consciência de que há grande literatura sendo produzida no país, e que se trata de um continente por explorar.
É difícil dizer com precisão quais os fatores que acarretaram esta mudança. Certamente, o maior relevo político-econômico do país, hoje a sétima economia mundial, sua maior participação em questões de política internacional, fizeram com que os holofotes iluminassem também as Letras do país. A bolsa de tradução da Biblioteca Nacional continua tornando possíveis traduções que antes seriam economicamente inviáveis para pequenas editoras. A Feira do Livro de Frankfurt trouxe muita atenção. Com o Salão do Livro de Paris, espera-se que novos frutos sejam colhidos.
Quando me perguntam (e isso já aconteceu algumas vezes): “Se eu fosse ler um único escritor brasileiro, qual eu deveria ler?”, eu geralmente respondo, primeiro, com uma pergunta: “Você perguntaria isso para um russo ou norte-americano?”, para logo em seguida dizer: Machado de Assis, não porque seja brasileiro, mas porque qualquer pessoa deveria lê-lo, como se lê Dostoiévski ou Faulkner não porque um é russo e o outro americano, mas porque são grandes autores. E, ao mesmo tempo, Machado só poderia ser brasileiro. O Brasil tem vários casos de grandes escritores universais mas brasileiros, como João Cabral de Melo Neto, para mencionar um grande poeta ao lado do grande prosador. O mundo, espero, continuará descobrindo estes nomes.