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Bandeira possível para o Matriarcado de Pindorama

Bandeira possível para o Matriarcado de Pindorama, desenhada por Philippe Leon

Bandeira possível para o Matriarcado de Pindorama, desenhada por Philippe Leon

Acontece às vezes de pessoas me perguntarem aqui no exterior se “Brasil” significa alguma coisa. O porquê desse nome. É mais difícil de explicar do que parece, pois mesmo a tradução para a árvore que deu origem ao nome do país apenas adota a palavra tal como é em português: pau-brasil em inglês é brazilwood, em alemão é Brasilholz. São traduções com adaptações de pau-brasil, traduzindo “pau” como “madeira”, mas sem traduzir a palavra “brasil”. Como então traduzir “brasil”? Pela lógica do português, brasil seria um adjetivo, derivado de brasa. O dicionário de Aurélio Buarque de Holanda dá várias definições para “brasa”: 1. Carvão ou lenha incandescente, mas sem chama; 2. Estado de incandescência; 3. Estado de afogueamento ou rubor vivo; 4. Mulher interessante, formosa; 5. Carvão e cinza que ficam no forno depois de apagado. Brasil é a qualidade da brasa. Da cor da brasa. Da natureza da brasa. É assim que tento explicar o nome a estrangeiros, passando pela madeira, sua importância para os invasores portugueses, a forma como se tornou sinônimo do país. A árvore tinha outros nomes nas variadas línguas autóctones do território: ibirapitanga e orabutã, por exemplo. O pigmento vermelho que se obtém da árvore é conhecido como brasilina. O nome científico da árvore costumava ser Caesalpinia echinata e passou a ser Paubrasilia echinata. No latim medieval, lignum brasilium.

Há alguns meses, o poeta e compositor carioca Mariano Marovatto publicou um texto intitulado “Genealogia do horror ao vermelho”, no ápice do ódio a esta cor e em meio à sanha antipetista – que levava pessoas até mesmo a atacarem outras na rua se estivessem de vermelho. Nele, Marovatto discute a história do nome e da cor vermelha em bandeiras, cor que jamais esteve na bandeira do Brasil. A partir do texto dele, comecei a me perguntar que outra bandeira possível seria esta, não mais ligada às cores dos invasores portugueses (o verde é a cor dos Bragança, o amarelo, dos Habsburgo). Voltei este mês aos textos de Oswald de Andrade, por ocasião do lançamento aqui na Alemanha das traduções de Oliver Precht para os dois manifestos do autor paulista. Escreverei sobre isso em breve. Se chamei este texto de “Bandeira possível para o Matriarcado de Pindorama”, foi em homenagem a Oswald e sua utopia. Aos nacionalistas, espero que isso acalme qualquer possibilidade de ofensa a seu brio verde-amarelo. Não propomos aqui uma bandeira vermelha comunista para o Brasil, como aquela senhora ensandecida pensou ser o caso da bandeira do Japão no Congresso há poucas semanas. Se há um desejo de comunhão, meu e de Marovatto, será antes a espécie de protocomunismo dos povos indígenas do território. Mas eu, pessoalmente, penso menos nesta bandeira para Pindorama, nome da terra mítica dos povos tupis, do que numa bandeira para um país verdadeiro, não o eterno país do futuro, mas um que talvez pudesse se chamar Ibirapitanga, talvez Orabutã, ou seja, Pau-Brasil, Brasil.

Abaixo, o texto de Mariano Marovatto, a bandeira que idealizamos e Philippe Leon desenhou, e um conto inédito meu, “Mulher de vermelho”, inspirado no atual red scare nacional. As cores da bandeira não querem representar conceitos ou raças. O branco poderia ser transparente, e assim veríamos apenas um pau-brasil brasil tremulando ao vento.

“Genealogia do horror ao vermelho”

Mariano Marovatto

Desde o século X o ocidente tinha registros da madeira nobre para fabricação de grandes objetos da qual se extraía também uma resina vermelha excelente para tingimento de tecidos. ‘Brecillis’, ‘brezil’, ‘brasil’, ‘bersil’ era o nome dado a essa madeira, derivados de seu original latino ‘brasilia’, em bom português, ‘cor de brasa’. Do litoral brasileiro, já nas primeiras décadas do século XVI, foram extraídas cerca de 70 milhões de árvores de pau-brasil. Grupos indígenas inteiros, designados para o corte das árvores, foram mortos ao longo desse período. Pela enorme quantidade de pau-brasil, aos poucos, a Terra de Santa Cruz começou a ser conhecida como Brasil. Os primeiros cronistas, cristãos e bajuladores da coroa, temiam pela troca do nome da terra descoberta. Gândavo pedia a restituição do primeiro nome, afirmando que só podia ter sido obra do demônio trocar o nome santo – a cruz feita de madeira que viu o sangue de Cristo escorrer – pelo nome de uma árvore demoníaca que sangrava também vermelho. João de Barros escreveu que ‘o nome de um pau que tinge panos’ não poderia ser mais importante que ‘daquele pau que deu tintura a todos os sacramentos por que fomos salvos, pelo sangue de cristo que nele foi derramado’. Na Europa a bandeira vermelha era hasteada, desde o século XV, nos castelos em guerra, opondo-se à bandeira branca de rendição: significava que ainda estavam em luta. A bandeira vermelha hasteada nos navios significava que uma vez capturados, nenhum homem seria poupado a bordo. Muitas bandeiras britânicas, espanholas, holandesas e a portuguesa, ao longo dos séculos seguintes, certamente tiveram o seu vermelho tingido de pau-brasil saído do litoral brasileiro, bem como o vermelho de todas as bandeiras de resistência. A bandeira brasileira – surgida muito tempo depois – que possui as cores da família de Bragança de Dom Pedro de Alcântara, verde, e da família Habsburgo, amarela, de Dona Leopoldina, jamais adotou o pigmento que deu origem ao nome e a invenção do país. Aboliu a cor da resistência em prol das mais reluzentes cores aristocráticas. Porém, herdou, canhestramente, o seu nome.

“Mulher de vermelho”

Ricardo Domeneck

(dedicado a André Capilé)

Era o Rio de Janeiro, capital nacional dos machos engraçadinhos. A mulher caminhava pela rua da Glória, chegando à do Catete, vestida de vermelho. Grávida, mas sem saber. Quando sentiu o vestido ser puxado com força por trás, só podia ser mão de estranho, entesou para a guerra. Quando virou, deu de cara com o homem, bufando. Era agosto de 2016. “Petista filha-da-puta!”, berrou o bofe, camisa entreaberta, cruz à vista. “Jesus é maior!” A senhora laqueada que passava saracoteia, aprova, acrescenta: “Acabou a mamata, cambada de ladrão!” O sangue vermelho debaixo do rosto, a mulher, pele negra como Nossa Senhora de Aparecida, o vestido feito o cair do sol na Baía de Guanabara, começou a responder “Tô de vermelho…”, mas não seguiu com o “… porque sô filha de Iansã”, com medo do que isso faria com os bufos do homem pardo de cruz e os saracoteios da senhora branca de laquê.

“Puta!”, gritou a senhora do laquê. “Vaca!”, gritou o homem da cruz. Dentro dela, sentiu mover-se uma búfala, já se preparava o leite no seu corpo, mas se conteve, segurou firme seus chifres. “Eparrei!”, solta, sem cabresto. O homem diz “Tá amarrado!”. A senhora se persigna. O Cristo mantém os braços abertos no Corcovado, a luz pública já começava a o deixar mais branco. Em Aparecida, Nossa Senhora seguia com as mãos unidas em prece. Santa virgem com filho morto. Seiva de pau-brasil escorria em um canto do estado. Fogo desmatava outra área. A mulher de vermelho seguiu a rua do Catete, a caminho do trabalho no sertão da rua do Ouvidor. Passa rápida pelo palácio que abriga o pijama do pai dos pobres, salpicado também de vermelho. A bandeira ondulava nas cores de Bragança e Habsburgo, o brasão das armas do Império contava estrelas para dormir. Na África, àquele momento baliam carneiros.

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segunda-feira 28.11.2016 | 11:03

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Aos holandeses que se esqueceram de suas invasões

Frans Post - "Visão do Rio São Francisco com o Fort Maurits e uma capivara" (1639)

Frans Post – “Visão do Rio São Francisco com o Fort Maurits e uma capivara” (1639)

Sempre que converso com holandeses do meio literário, fico ligeiramente chocado e até irritado com o fato tantos desconhecerem a história das invasões holandesas no território do Brasil colonial e sua presença por mais de duas décadas em Pernambuco. No último fim de semana, ao participar do festival literário “Read My World”, em Amsterdã, confirmei essa impressão. Ao abrir minha leitura, brinquei que isso me irritava por ter sido torturado quando criança com aulas de História sobre as Invasões Holandesas (1624-1654), e que o mínimo que a população holandesa de hoje podia fazer era saber que elas aconteceram. Percebi como algumas pessoas ergueram as sobrancelhas e se entreolharam, como quem diz: “Do que ele está falando?”

Vivendo na Europa há tantos anos, um dos meus passatempos favoritos é lembrar os europeus de seu desconfortável passado colonialista, especialmente quando ele retorna, às vezes ainda hoje, com tons  de ufanismo e veleidades civilizatórias. Outra piada minha recorrente nesse fim de semana por lá foi exigir açúcar quando os amigos traziam o café – sempre sem açúcar, já que por causa do adoçantezinho seu país havia invadido o meu.

Mas, piadas à parte, é realmente uma pena que Brasil e Holanda não tenham relações um pouco mais estreitas, tendo seus passados entrelaçados em episódios que, ao menos para nós brasileiros, foram importantes. Mesmo a figura de Maurício de Nassau (1604–1679), personagem marcante em nossa história colonial, frequentemente acaba confundida em conversas com o príncipe holandês Maurício de Orange-Nassau (1567–1625). Talvez seja compreensível, já que o “nosso” Nassau era um príncipe do Sacro Império Romano-Germânico, não holandês, empregado pela Companhia das Índias Ocidentais, que não entrou na história holandesa com a mesma pompa da contraparte oriental. Tampouco foi um prejuízo para eles, que fizeram muito dinheiro nas terras pernambucanas e deixaram algumas marcas com sua Cidade Maurícia no Recife, assim como cicatrizes em Olinda. Pensando bem, porém, quem de nós se lembra de Henrique Dias, um dos líderes negros da Insurreição Pernambucana?

Algo disso talvez seja corrigido com a exposição de desenhos de Frans Post, atualmente no Rijskmuseum de Amsterdã, que visitei no sábado. São desenhos até então esquecidos, 34 ilustrações descobertas por Alexander de Bruin (curador da coleção de imagens do museu), durante o processo de digitalização do acervo. Haverá um simpósio dedicado a Frans Post no dia 22 de novembro, com a presença de Jane Turner, Pedro Corrêa do Lago, Alexander de Bruin, e outros. Mas, ao visitar a exposição, confesso que aquilo que mais me marcou e chamou a atenção foi a coleção de animais da fauna brasileira empalhados pela comitiva de Maurício de Nassau. Há uma sucuri na sala de entrada, e a primeira sala com peças visuais tem como recepcionista uma capivara, congelada em sua caixa de acrílico, diante da famosa pintura de Frans Post Visão do Rio São Francisco com o Fort Maurits e uma capivara (1639). Chamem-me de sentimental, mas fui tomado de tristeza e solidariedade ao ver aquela capivara naquela caixa de acrílico, uma capivara do século 17. Não pude deixar de ficar imaginando o que ela havia visto, que Brasil fora aquele, ela que nadou no Rio São Francisco quando este talvez ainda fosse chamado por muitos de Pirapitinga. Saí da exposição com a frase “violência protegida por acrílico” rodando na cabeça.

Capivara capturada, morta e empalhada pela comitiva artística de Maurício de Nassau

Capivara capturada, morta e empalhada pela comitiva artística de Maurício de Nassau

Quanto à Literatura Brasileira na Holanda, o tradutor e escritor August Willemsen por anos cuidou de sua divulgação, e seu nome hoje é dado a um Instituto, o Stichting August Willemsen, que pretende continuar esse trabalho. Nos dias 21 e 22 de outubro, por exemplo, o instituto promove uma conferência sobre o Grande Sertão: Veredas (1956), de João Guimarães Rosa. A biografia de Clarice Lispector escrita por Benjamin Moser foi traduzida há pouco, e será realizado no dia 28 deste mês um evento no teatro da Stichting Perdu dedicado às traduções recentes para o holandês das crônicas da brasileira, reunidas em A descoberta do mundo (De Ontdekking van de Wereld, Privé-Domein, 2016), com tradução de Harry Lemmens. O evento conta com a presença de Benjamin Moser, Xandra Schutte, Arthur Japin, Lilian Vieira e Nina Polak.

No Brasil, o jovem tradutor Daniel Dago mantém com seu entusiasmo a conversa sobre a literatura holandesa acesa entre nós. Em grande parte, ele a acendeu com sua presença digital recentemente. O autor holandês mais conhecido no Brasil é possivelmente o mesmo que comparece em outros lugares, o poeta e romancista Cees Nooteboom, que teve lançados no país os livros Caminhos para Santiago (Nova Fronteira) e Paraíso Perdido (Companhia das Letras), por exemplo. A editora carioca Rádio Londres vem lançando trabalhos de um autor mais jovem como Arnon Grunberg, que passou recentemente com pompa pelo Brasil, e a Intrínseca lançou Herman Koch.

Um dos autores holandeses mais interessantes que descobri ultimamente, graças a Piet Joostens, foi Jeroen Mettes (1978-2006), que se matou com menos de 30 anos há uma década. Seu trabalho foi reunido no volume N30, um trabalho híbrido de ensaio e poesia do qual pude ler em inglês alguns capítulos. Também ficaria muito feliz em ver o grande Gerard Reve (1923-2006) mais conhecido no nosso país. E sabe o que seria bonito? Ver o romance-ideia de Paulo Leminski, seu Catatau (1975), traduzido para o holandês com suas alucinações de Descartes no Brasil. Só não queria estar na pele do tradutor.

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terça-feira 11.10.2016 | 11:07

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150 anos de Euclides da Cunha

euclides da cunha“O planalto central do Brasil desce, nos litorais do Sul, em escarpas inteiriças, altas e abruptas. Assoberba os mares; e desata-se em chapadões nivelados pelos visos das cordilheiras marítimas, distendidas do Rio Grande a Minas.” (Euclides da Cunha, Os Sertões, 1902)

Assim começa um dos livros mais estranhos e belos deste país de escritores de vidas curtas, trágicas, que nos deixam muitas vezes uma única obra prima, talvez falha, marcada por seu tempo (como deveria ser, de qualquer forma), mas que também ainda nos apontam caminhos, dão-nos pistas de onde erramos. Euclides de Cunha teria completado hoje 150 anos. Considerado um catatau difícil, talvez alguém estranhe se eu disser que se trata também de uma das leituras mais febris que já fiz nesta vida. Mas é o que foi, para mim, ao abrir aquela primeira página da primeira parte, “A Terra”, num ônibus que me levava da antiga capital do Império e da primeira República do Brasil, o Rio de Janeiro, às cidades portuguesas de Minas Gerais e destas mais tarde para a primeira capital do território, Salvador, numa viagem pelos litorais e interiores. Costas, cabeças e intestinos do país do qual sou cidadão. Um trem de Belo Horizonte a Vitória, que não sei se ainda carrega passageiros, levava também carvão. Cheguei dos intestinos do país a suas costas com a cara e o livro pretos de pó queimado da terra.

Falar sobre Euclides da Cunha é falar sobre Os Sertões, é falar sobre a transição do Império à República, sobre capital e interior, dualidades que sempre nos surgem na cabeça ao pensar sobre “esta terra de feracidades excepcionais”, como escreveu Manuel Bandeira no poema O cacto, cacto que evocava “o seco Nordeste, carnaubais, caatingas”. Pensar em Euclides da Cunha, escritor do Rio de Janeiro em pleno sertão, é pensar sobre os dois Brasis que se encaram em determinados momentos da história e se estraçalham um ao outro, com um lado vitorioso, ao menos até agora, sempre o mesmo. Naquele momento, os dois lados eram propostos como “A rua do Ouvidor e as caatingas”, ou, como escreve Euclides da Cunha: “A rua do Ouvidor valia por um desvio das caatingas. A correria do sertão entrava arrebatadamente pela civilização adentro. E a guerra de Canudos era, por bem dizer, sintomática apenas. O mal era maior. Não se confinara num recanto da Bahia. Alastrara-se. Rompia nas capitais do litoral.”

Há pouco tempo, revi com um amigo o filme Capote (2005), com aquela atuação genial de Philip Seymour Hoffman no papel de Truman Capote durante a escrita de seu livro In Cold Blood (1966), no qual o americano pretendia inventar um novo gênero, a non-fiction novel. Ao ver o filme pela primeira vez, pensei: “Mas já não tinha Euclides da Cunha inventado o gênero com Os Sertões?” Contudo, se no livro de Capote um crime isolado no interior dos Estados Unidos assume proporções épicas, de caráter investigativo da alma nacional, de duas Américas que se encontravam e encaravam de forma violenta numa noite de novembro de 1959, em Os Sertões, temos o relato de uma guerra civil, a sangue frio e quente, a mais violenta de nossa história, na qual uma cidade inteira foi dizimada. Era o ano de 1896, 1897, República recém-instaurada, e, como fanáticos positivistas, as forças republicanas encontravam-se e digladiavam-se no sertão com aqueles que viam como fanáticos religiosos de forças monarquistas.

Euclides da Cunha partiu, contratado pelo jornal O Estado de S. Paulo, como correspondente de guerra, após seus primeiros artigos sobre o conflito, intitulados A nossa Vendeia. Já se tratava de um indício da posição republicana do escritor, ao comparar Canudos às forças contrarrevolucionárias da Vendeia, após a Revolução de 1789, durante a Primeira República Francesa. Positivista, militar de carreira, republicano convicto, foi com esse espírito que Euclides da Cunha partiu para a guerra, convencido da legitimidade da posição do governo federal.

No entanto, alguns anos depois de testemunhar o massacre da população de Canudos pelas forças republicanas, a meditação do escritor sobre “A Terra”, “O Homem” e “A Luta” daquela região em Os Sertões – livro que escreveu em São José do Rio Pardo, no interior de São Paulo, onde trabalhava como engenheiro na construção de uma ponte – tornou-se o nosso épico antiépico. Pois, se a épica é formada pelos mitos de fundação de uma nação, Os Sertões é muito mais o relato de nossa “findação”: olhando para ele agora, após mais de um século, vê-se que “A rua do Ouvidor e as caatingas” continuam de costas uma para a outra, como Brasis que não se entendem e seguem se estraçalhando nas ruas das capitais do país.

“O sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão”, profetizou essa figura estranhíssima da nossa história, Antônio Conselheiro, que eu próprio, homem de São Paulo, talvez jamais possa verdadeiramente compreender. Mas se olhamos com atenção, como Euclides da Cunha o fez, para a terra, o homem e a luta, chegamos mais próximos das reivindicações daquela população da grande cidade inoficial do país, uma capital às avessas, Canudos. Cidade que hoje está alagada por um açude, deixando a cruz de sua catedral à vista em períodos de seca. As calotas polares derretem-se. Talvez não tenha previsto Antônio Conselheiro que é a Rua do Ouvidor que um dia virará mar. Das ingerências da República, já se garantiu que de Mariana à foz do Rio Doce no Atlântico, parte do interior se transformasse em mar de lama.

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quarta-feira 20.01.2016 | 12:24

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