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A semana em que morreu Leonard Cohen

Talvez em dez ou vinte anos, alguns de nós venhamos a dizer ao redor de uma mesa de boteco, “foi naquela semana em que morreu Leonard Cohen”, adicionando com uma tristeza que só em dez ou vinte anos saberemos quão grande será, “e na qual Donald Trump elegeu-se presidente dos Estados Unidos.” Em dez ou vinte anos, já com o número de mortos oficiais dos acontecimentos que hão-de desenrolar-se a partir desta semana.

Canções e poemas estão sempre misturados de História, a coletiva, e Memória, a pessoal. Ao saber da morte de Leonard Cohen esta madrugada, em um dos botecos berlinenses por onde arrastei a carcaça na noite de ontem, pensei em um menino que tinha o vinil de ‘Songs from a Room’ e ouvia “Story of Isaac“ sem parar.

The door it opened slowly,
My father he came in,
I was nine years old.
And he stood so tall above me,
His blue eyes they were shining
And his voice was very cold.

Era um poema lírico na acepção mais clara do termo, e tão épico ao mesmo tempo. Como era épica aquela outra canção do álbum que finalmente ouvi quando o menino deixou o álbum todo tocar, “The Partisan”.

When they poured across the border
I was cautioned to surrender
This I could not do.
I took my gun and vanished.
E a canção declarava que a liberdade viria, e ela parecia falar de um tempo já ido, e que portanto a liberdade já havia chegado, e havia, e nós estávamos naquela cama, e as fronteiras pareciam estar se dissolvendo, e nós achávamos que estávamos vencendo. A canção falava de um tempo passado e falava de um tempo futuro, eu sei agora. Porque a guerra ainda não acabou. E a morte não para. Não se detém. Não nos dá tempo sequer de velar o morto da manhã, já nos joga na cara o morto da tarde.

Enquanto escrevia esse texto sobre a morte de Leonard Cohen, chega a notícia da morte da escritora austríaca Ilse Aichinger. Volto ao topo desse texto, onde o título lia “A semana em que morreu Leonard Cohen” e peço então ao leitor que pense nele como “A semana em que morreram Leonard Cohen e Ilse Aichinger e os incontáveis outros”, e encerro logo com minha tradução de um pequeno poema de Aichinger, antes que cheguem os mortos da noite.

“Conselho temporário”

Primeiro,
você precisa crer
que chega o dia
quando sobe o sol.
Caso você porém não creia,
diga sim.
Segundo,
você precisa crer
e com todas as suas forças
que chega a noite
quando sobe a lua.
Caso você porém não creia,
diga sim
ou anua receptivo com a cabeça,
também aceitam isso.

:

“Zeitlicher Rat”
Ilse Aichinger

Zum ersten
mußt du glauben,
daß es Tag wird,
wenn die Sonne steigt.
Wenn du es aber nicht glaubst,
sage ja.
Zum zweiten
mußt du glauben
und mit allen deinen Kräften,
daß es Nacht wird,
wenn der Mond aufgeht.
Wenn du es aber nicht glaubst,
sage ja
oder nicke willfährig mit dem Kopf,
das nehmen sie auch.

Data

sexta-feira 11.11.2016 | 16:30

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